Postal.pt: 'Algarve: a COVID-19 e as alterações climáticas'
Artigo de opinião da autoria do eurodeputado Francisco Guerreiro: "Actualmente esta região excessivamente dependente do turismo ou de sectores agrícolas intensivos esforça-se para se manter à tona e demasiadas pessoas e empresas arriscam a pobreza e a insolvência"
ARegião Algarvia tem para mim um carinho especial porque desde tenra idade passo lá férias e períodos festivos, mais precisamente em Albufeira. Faz mais de 30 anos que vejo o crescimento da região, seja no barlavento ou sotavento, tal como no litoral e interior, e não há outra análise que se possa conceber se não que as políticas implementadas pelos governantes correntes, subentenda-se quem têm governado o Algarve (PS, PSD e CDS), colocaram a região à beira de um colapso social, económico e ambiental.
Numa região com elevado potencial turístico, sobretudo ligado à ecologia e à preservação dos ecossistemas, investiu-se na massificação pelo custo baixo e de curta duração. Vimos popular na orla costeira empreendimentos, marinas, passadiços, parques de estacionamento, e faltou a implementação uma visão adaptada à região algarvia e aos seus de longo prazo. Sem a capacidade de criar um sistema resiliente de produção alimentar (sem agrotóxicos e super intensividade), que promova o empreendorismo e a independência energética de pessoas, empresas e instituições, sem infraestruturas de comunicação assentes em energias 100% renováveis, sem uma estratégia de turismo que agregue estes elementos todos, e sobretudo, sem lideranças progressistas, assistimos à perda de milhares de milhões de euros, ao longo destes anos. Acresce a precariedade de múltiplos postos de trabalho devido à sazonalidade de muitos sectores e a falta de visão municipal, regional e nacional para garantir a fixação de indústrias e empresas com alto valor acrescentado.
E, num cenário de profundas alterações climáticas, os dados científicos recentes mostram que a região será duramente afectada. É incompreensível que se olhe para o Algarve e se continue a planear como se estivessemos na década de 70. Casos como a falta de protecção para as Alagoas Brancas, em Lagoa, o incentivo ao cultivo de produções agrícolas super intensivas, de abacateiros por exemplo, ou mesmo a constante poluição costeira por resíduos plásticos e a falta de capacidade de muitas ETARS no período de Verão, demonstra que pouco se mudará se continuarmos a pensar que estes problemas são pontuais e não sintomas de uma estrutura disfuncional de poder público.
Pior, a covid-19 demonstrou-nos a fragilidade deste planeamento urbanístico, económico e social de curto prazo. Actualmente esta região excessivamente dependente do turismo ou de sectores agrícolas intensivos esforça-se para se manter à tona e demasiadas pessoas e empresas arriscam a pobreza e a insolvência. Como não planeámos construir com os cidadãos uma região resiliente, mais independente a nível energético, com mais capacidade de empreendorismo e com flexibilidade de se adaptar perante fenómenos extremos, como a COVID-19, os reflexos estão à vista.
Talvez consiga sumarizar com o que vi acontecer à zona dos Salgados ao longo dos anos onde um local que era praticamente inóspito e virgem agora é povoado por empreendimentos turísticos, muitos deles vazios, rodeado de parques de estacionamento, passadiços, redes de arame e concessionários de praia. Mercantiliza-se tudo e nada se preserva. Assim vão os destinos desta belíssima região que tem muito mais que praia, urbanismo desmesurado e turismo de massas.
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